A decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), de determinar a instalação da CPI da Covid-19 no Senado Federal, fez o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) estimular a Casa abrir um processo de impeachment contra ministros da Suprema Corte.
Atualmente, há 10 pedidos de afastamento de ministros do STF tramitando no Senado, mas Barroso não é o recordista. Este posto é do ministro Alexandre de Moraes, com sete – sendo seis pedidos específicos contra ele e um que reúne todos os 11 integrantes da Corte.
Moraes é o relator de dois inquéritos que atingem diretamente os bolsonaristas: o que investiga atos antidemocráticos realizados em 2020 e outro sobre divulgação de fake news. O professor de ciência política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Leon Victor Queiroz, especialista em Judiciário, pontua que este volume tem relação direta com a atuação do ministro. “Moraes é quem mais está questionando o governo por causa do inquérito das fake news e do inquérito dos atos antidemocráticos. Na verdade, ele ser alvo destes muitos pedidos é uma reação há essa atuação”, avalia.
O especialista destaca o pedido de prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) e da abertura por ofício do inquérito das fake news, sem pedido do Ministério Público. “Muitas decisões do Supremo estão meio fora do que se entende de ordinário”, acrescenta.
Contando com o pedido que atinge todos os ministros, Edson Fachin tem dois na conta, Gilmar Mendes, dois, e Cármen Lúcia, dois.
Indeferidos
Contudo, consta ao menos 65 pedidos de impeachment de ministros desde 2008, sendo 55 indeferidos. Algumas destas petições pedem a destituição de mais de um ministro.
Moraes, com 24 pedidos, é o recordista, seguido por Dias Toffoli, com 14, e Mendes, 12. Barroso foi alvo de sete pedidos, Ricardo Lewandowski, de seis, Marco Aurélio Mello e Fachin, de cinco, cada, e Cármen Lúcia e Luiz Fux, de três, cada. Rosa Weber, de dois. Nunes Marques tem um.
Os ex-ministros Joaquim Barbosa e Celso de Mello foram alvo de um e três pedidos, respectivamente.
O primeiro pedido que consta no sistema do Senado remonta a 2008, com Gilmar Mendes como alvo. Entretanto, é a partir de 2016 que os pedidos passam a ser mais frequentes.
Queiroz pondera que esse movimento pode ter relação com o aumento de atrito entre Legislativo e Executivo e a busca do Judiciário como árbitro deste conflito. “Quem perder vai tentar retaliar com pedidos de impeachment”, pontua.
Rito
O impeachment de ministro é regido pela Lei 1.079/1950, a mesma que trata da destituição de presidente da República e outros agentes públicos. Os artigos 39 e 39-A versam sobre os crimes de responsabilidade e incluem, dentre outras condutas o ato de o magistrado proferir julgamento quando, por lei, for considerado suspeito na causa, exercer atividade político-partidária e agir de modo incompatível com a honra, dignidade e decoro inerente à função.
Qualquer cidadão pode apresentar pedido de impeachment.
O rito é: acolhido pela Mesa do Senado, a denúncia é lida na sessão e avaliada por uma comissão especial, eleita especialmente para o caso, que terá o prazo de 10 dias para emitir parecer sobre a admissibilidade ou não da denúncia. Em seguida, o parecer da comissão será lido em sessão e submetido a votação por maioria simples de votos nominais. Se o pedido for recusado, é arquivado.
Se admitido, o denunciado terá acesso a uma cópia de todos os documentos e um prazo de 10 dias para responder à acusação. Após esse prazo, a comissão terá mais 10 dias para definir se a acusação procede ou não, e um novo parecer deve ir para votação no plenário. Mais uma vez, precisa de maioria simples para ser aprovado.
Se a Casa decidir dar prosseguimento ao impeachment, precisa dar imediato conhecimento da decisão ao Supremo, ao denunciado e ao denunciante. O ministro fica suspenso de suas atividades até a decisão final, e perde um terço dos vencimentos.
A partir daí, o Senado julgará o ministro, sob o comando do presidente do Supremo – caso ele seja o acusado, seu substituto legal quem preside. Nessa fase, testemunhas são inquiridas publicamente e há debate oral. Ao final das discussões, o presidente do STF deve fazer um relatório resumido e submetê-lo a votação nominal, e que exige dois terços dos votos dos senadores.
Caso seja absolvido, o ministro recebe o retroativo dos vencimentos que estavam suspensos.
“É difícil calcular o risco de um impeachment prosperar. A gente tem observado um conflito fora da curva entre as instituições. A relação está muito conflitiva. Não sei a que ponto um impeachment no Senado possa prosperar, mas acho muito difícil”, analisa Queiroz.
Curiosidade
Apesar da movimentação contra ministros do STF, nunca houve um impeachment deste tipo na história brasileira. Entretanto, um ministro já foi afastado da Corte – neste caso, rejeitado após assumir.
Trata-se do médico, professor e político Barata Ribeiro, que foi nomeado ministro do STF em 23 de outubro de 1893, em decorrência do falecimento de Barão de Sobral. Ribeiro tomou posse em 25 de novembro daquele ano. Mas o Senado, em sessão secreta, em 24 de setembro de 1894, negou a aprovação por falta de “notável saber”. Dez meses depois de assumir, Ribeiro deixou o cargo.
Por Metrópoles